Você sabe o que é Amor Negativo? É muito comum perceber, para quem já passou por alguns relacionamentos amorosos, um padrão comum entre eles. Talvez comecem com uma paixão, se desenvolvam para um relacionamento morno até terminarem com a sensação de frustração. Durante a relação, talvez você não sinta que tenha atenção devida por parte dele/a, ou ainda tenha a sensação de não conseguir nunca agradar suficientemente o outro. As formas de insatisfação podem ser diferentes para cada um, mas todas elas trazem uma sensação familiar e conhecida da nossa infância: insegurança, incapacidade, impaciência, desagrado, etc.
Esse “amor” que vivemos nos relacionamentos é conhecido como Amor Negativo, um conceito criado por Bob Hoffman nos anos 60, e diz respeito à forma como o indivíduo desenvolve sua atitude de estar no mundo através do que recebeu ou aprendeu dos seus pais, ou de quem quer que tenha participado da sua criação na infância. Segundo este conceito, poucas são as possibilidades de se relacionar com o outro fora deste legado.
É como se durante a nossa infância, ficasse gravado conceitos de “certo” e “errado”, o que é aceitável e o que não é, quais são os meus gostos, quais são minhas formas de relacionar com as pessoas, e quais são as formas que uso para reagir e sobreviver ao ambiente em que fui criado. Uma vez que é estabelecida essa base, que chamamos de identidade, passamos a enxergar o mundo através desse referencial, seja repetindo-o, seja fazendo o inverso (mas ainda tendo como referência essa base). É como se fosse colocado um filtro de óculos para enxergarmos a realidade.
Criar um repertório completamente desvinculado a esse referencial gera uma estranheza tal que o indivíduo não se reconhece, passando a repelir ou a ignorar tais possibilidades.
COMO ACONTECE?
Todos nós aprendemos o que é amor, e como nos relacionar, através das formas que recebemos dos nossos pais – ou de quem quer que tenha nos criado. Tanto pelos aspectos da falta, da humilhação, da tristeza ou do desmerecimento, quanto pelo excesso de cuidado, carinho e falta de limites, o indivíduo adota como referencial de amor a forma recebida. A partir daí, o que se enxerga como amor ou o que permite a “conexão” com o outro são as sensações de falta ou excesso similares às sentidas na infância. A “familiaridade” com o outro é o que coloquialmente se chama de química ou paixão à primeira vista, mas trata-se de uma programação básica que determina a forma de cada um enxergar o fenômeno “amor”. Ainda que para alguns indivíduos o que dispara a sensação de conexão é o exato oposto às características recebidas na infância, a referência continua sendo a mesma.
O que se pode concluir então é que a forma com que nos relacionamos são condicionadas a um referencial de amor que não é um amor construído ou escolhido, mas um amor determinado por aspectos que relacionamos à nossa infância. Para poder se relacionar de uma forma diferente é preciso viver uma estranheza na qual não nos reconhecemos e talvez não nos desperte tanto interesse no início, requerendo um grau de esforço e vontade altos de ambas as partes.
NOSSA EXPERIÊNCIA COM O TEMA
Através do ambiente familiar, também ficam gravadas referências do que é ser “homem” ou “mulher”, dos papéis que cada um exerce na relação. Alguns homens, por exemplo, têm dificuldade de se relacionar ou se entregar num relacionamento, por conta das formas abusivas de suas mães na infância, repelindo qualquer aproximação de um/a parceiro/a para não sentir novamente aquela forma de invasão. Algumas mulheres criam uma máscara de força e autossuficiência, maltratando ou subjulgando seus parceiros como forma de “vingar” a raiva que têm de seus pais. Esses são apenas alguns exemplos, as formas são diversas, mas é importante entender que não é necessário ter tido uma família desestruturada para que tomemos as referências que nos foram passadas.
Em todos estes anos trabalhando com relacionamentos, notamos que a maioria das pessoas que chegam até nós, não percebem como tais referências afetam suas vidas. Muitos dos nossos clientes dizem que os pais foram legais, e que está tudo bem, sem perceber que estão repetindo as mesmas formas adquiridas por eles. As pessoas têm idéias e crenças prontas (talvez tiradas de novelas ou filmes água com açúcar) do que deveria ser ou um relacionamento “feliz”, muito distante da prática de como se relacionar na vida real, criando para si frustrações e dificuldades de lidar com os desafios que um relacionamento traz.
A maioria pensa no amor como um fenômeno que acontece por si só, provavelmente da mesma forma como aconteceu com seus pais. Quase ninguém consegue notar a quantidade de referências e padrões que foram adquiridos através dos nossos pais. E quando se faz uma investigação profunda sobre isso, é como se aqueles óculos que filtram a realidade fossem retirados, para passar a enxergá-la como realmente é. A partir desse ponto, é possível interferir conscientemente, com mudanças de atitudes, com responsabilidades diferentes, com uma pré-disposição para a construção de uma forma de se relacionar nova, para se viver amor real.
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